Vez por outra acontece de uma paciente ir ao meu consultório com idéia de fazer uma cirurgia plástica, mas sem saber exatamente em que parte. “O que o senhor acha que devo mudar para ficar mais bonita?”, perguntam, explicando que “chegou a idade da cirurgia plástica” e que “as amigas estão todas correndo para os consultórios”.
A história ilustra uma característica desconcertante da época em que vivemos. Submeter-se a uma plástica tornou-se símbolo de status – quase uma obrigação entre homens, mas principalmente mulheres, de classes sociais mais abonadas. Embora ganhe a vida como cirurgião e adore tornar as pessoas mais bonitas e confiantes por meio do meu bisturi, me inquieta perceber que muitos pacientes procuram a plástica para cumprir um certo rito social.
Há ainda os que vão ao cirurgião como quem procura o emissor de um passaporte para o sucesso, numa sociedade hedonista, em que a beleza tornou-se característica vital para o êxito na profissão e a conquista da felicidade. Nós, cirurgiões, não podemos tanto...
Como posso dizer a uma pessoa que característica física ela deve mudar para “ficar melhor”? Só deve ser modificado algo que incomoda, não há como saber isso pelo outro. O cirurgião não deve ser visto como alguém capaz de limpar imperfeições conforme o padrão estético vigente. E a cirurgia plástica não pode ser encarada como um modismo, até porque seu resultado é duradouro.
Cabe ao cirurgião ajudar a tornar pessoas melhores dentro do que são, sem descaracterizá-las. Não me canso de dizer: não adianta ter a boca da atriz , o nariz da y, o seios da z, se eles não combinam com o tipo físico da paciente. Neste casos, perde-se o padrão de naturalidade e harmonização. Vejo que muitas pacientes buscam uma beleza idealizada na esperança de mimetizar, junto com as características físicas das artistas, a vida glamourosa que elas levam. Nada mais equivocado.
A maioria das pessoas não sabe que boa parte das celebridades adora fazer plástica e dizer que não fez e quase sempre declara nas revistas que “usa só uns creminhos”, “quase não se exercita” e “come de tudo” para construir uma imagem delineada por especialistas em comunicação e marketing. Deuses do Olimpo são bonitos por natureza, diz o mito; atores famosos são os olimpianos do nosso tempo. Que os nossos pacientes saibam disso e saibam ser críticos e conscientes, na hora de procurar uma cirurgia.
Usada na época e na dose certa, uma cirurgia plástica produz excelente efeito na melhoria da qualidade de vida das pessoas. Não nos cabe dar sentido à vida de nossos pacientes, mas constituir condições favoráveis para que eles próprios encontrem o sentido e a essência de vida que podem estar perdidos.
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